«Vejamos mais um exemplo de como uma discussão lógica depressa se transforma numa discussão de questões filosóficas profundas (Pritchard,1985). Um grupo de alunos do 5.º ano considera a afirmação "Todas as pessoas são animais." Esta afirmação foi proposta por um estudante como mais um exemplo de uma afirmação que se torna falsa quando invertida. Jeff objectou que "Todas as pessoas são animais" não é verdadeira. Chip passou a desenvolver uma taxonomia que situou as pessoas, de parceria com elefantes e tigres, debaixo da categoria dos mamíferos, mamíferos debaixo de animais e animais debaixo de seres vivos. Jeff manteve a objecção.
Chip: "Jeff, o que são pessoas? Diz-me, o que são pessoas? Podes responder, não podes?"
Jeff: "Sim, posso."
Chip: "O que és tu?"
Jeff: "Uma pessoa."
Chip: "O que é uma pessoa?"
Jeff: "Alguém que vive."
Chip: "Alguém que vive pode ser uma baleia."
Jeff: "Eu disse alguém, não um animal..."
Chip: "Podes consultar qualquer livro na biblioteca — bem, qualquer um que seja acerca de nós..."
Larry: "Gostaria de saber por que razão estão todos a ficar irritados com um assunto tão insignificante."
Rich: "Estamos a pensar! É para isso que estamos aqui.
Amy: "Alguém tem aqui uma enciclopédia para procurar animais, mamíferos ou pessoas?"
Jeff: "Somos todos humanos. Se um tipo de Marte nos visse, diria: 'Ei, olhem, estão ali alguns seres humanos.' Não diria: 'Ei, olhem alguns animais lá em baixo.'''
Mike:"Os Marcianos, se é que há algum, diriam: 'Ei, olhem para aquelas criaturas de aspecto estranho', ou qualquer coisa do género. Eles não saberiam o que nós somos. Eles não sabem nada acerca de nós. [ Regressando à distinção original de Jeff, Mike prossegue.] Se é uma pessoa, dizes 'alguém' (somebody). Se é um animal, já dizes 'uma coisa' (something). Alguém é um corpo humano".
Chip: "Existe vida, ok? A partir daí podes fazer ramificações. Tens animais, plantas e mais seja o que for — tu sabes, moléculas e coisas do género. Agora vais até animais e continuas a fazer ramificações — mamíferos, anfíbios, répteis e mais seja o que for. A seguir mais umas ramificações e tens estes humanos especiais. Até aqui está certo, Jeff?
Jeff: "Continua."
Chip: "Bem, quero saber se concordas até aqui."
Jeff: "Continua. Não vou mudar de ideias. E é tudo... Não sou um animal. Sou uma pessoa e vou continuar a pensar desta maneira."
Chip: "Tu és um tipo de animal."
Jeff: "Não me vou dirigir ao Dr. Jekyl e pedir-lhe: 'Ei, transforma-me num animal'..."
Amy: "As pessoas são um tipo de animal, como os pássaros. É diferente do que um elefante é. Um pássaro é diferente de um elefante. E nós somos diferentes do pássaro. O Mike disse que não tratamos o nosso cão como uma pessoa ou alguém. Mas pode haver alguém realmente próximo do seu animal de estimação e considerá-lo parte da família."
A discussão continuou por mais alguns minutos. Mal o grupo dispersou, um estudante comentou com outro: "Se quiséssemos podíamos argumentar durante horas!" "Durante dias," retorquiu o segundo. Como este grupo reunia semanalmente depois da escola na biblioteca pública local, na semana seguinte as crianças voltaram com uma enciclopédia para decidir a questão. Depois de alguns minutos de discussão, o professor perguntou aos estudantes se eles pensavam que tudo o que a enciclopédia dizia era verdadeiro.
Emily: "Não estamos certos de algumas coisas; e a enciclopédia podia dizer tudo o que há a dizer sobre como o sistema solar foi formado, e diria provavelmente que houve uma grande poeira que girava como um pião. Mas não temos a certeza de que tenha sido assim. Logo, pode estar errada.
O professor perguntou se nesses casos a enciclopédia diz "Não estamos certos."
Mike: "Dirá 'hipótese' — o que é uma suposição."
Kurt: "Dirá que ainda não estamos certos."
Deste modo, a discussão manteve a sua vitalidade filosófica. Este grupo encontrou-se ao longo de todo o ano lectivo e debateu uma grande variedade de tópicos filosóficos, incluindo a relação entre mente e cérebro, diferenças e semelhanças entre sonho e realidade, conhecimento de outras mentes, auto-conhecimento e a relação entre provas e conhecimento.»